Argumentação e coesão
COMUNICAR não significa apenas enviar
uma mensagem e fazer com que nosso ouvinte/leitor a receba e a compreenda. Dito
de uma forma melhor, podemos dizer que nós nos valemos da linguagem não apenas
para transmitir ideias, informações. São muito frequentes às vezes em que
tomamos a palavra para fazer com que nosso ouvinte/leitor aceite o que estamos
expressando (e não apenas compreenda); que creia ou faça o que está sendo dito
ou proposto.
Comunicar não é, pois, apenas um fazer
saber, mas também um fazer crer, um fazer fazer. Nesse sentido, a língua não é
apenas um instrumento de comunicação; ela é também um instrumento de ação sobre
os espíritos, isto é, uma estratégia que visa a convencer, a persuadir, a
aceitar, a fazer crer, a mudar de opinião, a levar a uma determinada ação.
Assim sendo, talvez não se
caracterizaria em exagero afirmarmos que falar e escrever é argumentar.
TEXTO ARGUMENTATIVO é o texto em que
defendemos uma ideia, opinião ou ponto de vista, uma tese, procurando (por
todos os meios) fazer com que nosso ouvinte/leitor aceite-a, creia nela.
Num texto argumentativo, distinguem-se
três componentes: a tese, os argumentos e as estratégias argumentativas.
TESE, ou proposição, é a ideia que defendemos,
necessariamente polêmica, pois a argumentação implica divergência de opinião.
A palavra ARGUMENTO tem uma origem
curiosa: vem do latim ARGUMENTUM, que tem o tema ARGU , cujo sentido primeiro é
"fazer brilhar", "iluminar", a mesma raiz de "argênteo",
"argúcia", "arguto".
Os argumentos de um texto são
facilmente localizados: identificada a tese, faz-se a pergunta por quê? (Ex.: o
autor é contra a pena de morte (tese). Porque … (argumentos).
As ESTRATÉGIAS não se confundem com os
ARGUMENTOS. Esses, como se disse, respondem à pergunta por quê (o autor defende
uma tese tal PORQUE … – e aí vêm os argumentos).
ESTRATÉGIAS argumentativas são todos
os recursos (verbais e não-verbais) utilizados para envolver o leitor/ouvinte,
para impressioná-lo, para convencê-lo melhor, para persuadi-lo mais facilmente,
para gerar credibilidade, etc.
Os exemplos a seguir poderão dar
melhor ideia acerca do que estamos falando.
A CLAREZA do texto – para citar um
primeiro exemplo – é uma estratégia argumentativa na medida em que, em sendo
claro, o leitor/ouvinte poderá entender, e entendo, poderá concordar com o que
está sendo exposto. Portanto, para conquistar o leitor/ouvinte, quem fala ou
escreve vai procurar por todos os meios ser claro, isto é, utilizar-se da
ESTRATÉGIA da clareza. A CLAREZA não é, pois, um argumento, mas é um meio
(estratégia) imprescindível, para obter adesão das mentes, dos espíritos.
O emprego da LINGUAGEM CULTA FORMAL
deve ser visto como algo muito es-tra-té-gi-co em muitos tipos de texto. Com
tal emprego, afirmamos nossa autoridade (= "Eu sei escrever. Eu domino a
língua! Eu sou culto!") e com isso reforçamos, damos maior credibilidade
ao nosso texto. Imagine, estão, um advogado escrevendo mal … ("Ele não
sabe nem escrever! Seus conhecimentos jurídicos também devem ser
precários!").
Em outros contextos, o emprego da
LINGUAGEM FORMAL e até mesmo POPULAR poderá ser estratégico, pois, com isso,
consegue-se mais facilmente atingir o ouvinte/leitor de classes menos favorecidas.
O TÍTULO ou o INÍCIO do texto
(escrito/falado) devem ser utilizados como estratégias … como estratégia para
captar a atenção do ouvinte/leitor imediatamente. De nada valem nossos
argumentos se não são ouvidos/lidos.
A utilização de vários argumentos, sua
disposição ao longo do texto, o ataque às fontes adversárias, as antecipações
ou prolepses (quando o escritor/orador prevê a argumentação do adversário e
responde-a), a qualificação das fontes, a utilização da ironia, da linguagem agressiva,
da repetição, das perguntas retóricas, das exclamações, etc. são alguns outros
exemplos de estratégias.
COESÃO
E ARGUMENTAÇÃO.
O fato de o ato de escrever ser um
momento em que aquele que escreve se vê sozinho frente ao papel, tendo em mente
apenas uma imagem de um possível interlocutor, faz com que haja necessidade de
uma maior preocupação em relação à coesão. Em geral, o aluno não sabe até que
ponto deve explicitar o que tenta dizer para que se faça compreender.
Entretanto, o "fazer-se compreender" é um ponto central em qualquer
texto escrito; a coesão deve colaborar neste sentido, facilitando o
estabelecimento de uma relação entre os interlocutores do texto. O que se busca
não é um texto fechado em si mesmo, impenetrável a qualquer leitura e sim algo
que possa servir como veículo de uma interação entre os interlocutores.
Há ainda mais uma questão em que se
deve pensar na consideração das especificidades da modalidade escrita – a
argumentação. É através dela que o locutor defende seu ponto de vista. A
argumentação contribui na criação de um jogo entre quem escreve o texto e um
possível leitor, já que aquele discute com este, procurando mostrar-lhe que
tipo de ideias o levaram a determinado posicionamento. Dito de outra maneira,
ao escrever um texto o locutor estabelece relações a partir do tema que se
propôs a discutir e tira conclusões, procurando convencer o receptor ou
conseguir sua adesão ao texto.
Não
se pode traçar uma distinção absoluta entre coesão e argumentação: a coesão
garante a existência de uma relação entre as partes do texto que tomadas como
um todo devem constituir um ato de argumentação. As duas noções contribuem para
a constituição de um conjunto significativo capaz de estabelecer uma relação
entre o sujeito que escreve e seu virtual interlocutor.